{Estrangeira #21} O primeiro livro que escrevi
Tudo que a gente coloca no mundo tem potencial de tocar alguém.
O ano era 2009 e eu tive uma ideia. Quis eternizar uma história que a minha mãe contava sobre a Lagoa Rodrigo de Freitas no Rio. Comecei a falar sobre o assunto e encontrei alguém a fim de ilustrar a história. A Anna Tereza fez um trabalho excelente, mas reclamou quando usei o termo “homem branco” e pediu para trocar para “homem civilizado".
A história desse livrinho, o Lagoa Coração, fala sobre como a Lagoa costumava beijar o oceano e vivia muito bem pulsando vida em harmonia com o povo indígena que ali vivia e os animais e plantas. Até que um dia chegam os europeus e cagam tudo construindo um monte de prédio e jogando lixo na Lagoa. O lixo vira um monstro horrível e a Lagoa é finalmente salva por uma menina que coloca todo mundo para catar o lixo.
Eu tenho ranço até hoje sobre ter colocado o tal do “homem civilizado", mas com o passar dos anos aprendi a ver isso de forma irônica. O homem é tão civilizado que destruiu toda a harmonia. Grandes bostas de civilização. Pensei em colocar aspas em todas as impressões que tenho, mas agora aceito que tenho que deixar esta interpretação com os adultos ao contarem a história para os pequenos ouvintes.
Lá em 2009 publiquei o livro de forma independente. Registrei na Biblioteca Nacional, fiz um ISBN que na época exigia um pedido presencial. Meu tio ajudou com a diagramação. Achei uma gráfica legal, paguei 500 reais por 500 livros, acho. Depois consegui que uma livraria infantil linda no Humaitá, a Artimanha (quem lembra?), fizesse o lançamento comigo. Teve pipoca e água de coco. Foi muito legal.
Depois o livro ficou na Travessa e em outras livrarias infantis independentes da cidade das quais nunca recolhi a comissão nem os livros não vendidos. Foquei mais em dar para bibliotecas municipais, levei alguns para Moçambique e entreguei para crianças que cruzaram meu caminho (teve até briga).
Mais tarde o livrinho virou presente para amigas que se tornavam mães. O mais irônico é que meu filho não gostava que lesse este livro e quando minha filha chegou, eu nem tentei, mas segui presenteando. Mês passado teve um evento de troca de livros aqui na escolinha das crianças em Portugal e como todos os livros que podíamos nos desfazer já haviam sido doados ou vendidos há pouco tempo quando deixamos Berlim, eu só tinha cópias dos meus para oferecer.
A diretora da escola amou e ontem, no Dia da Terra lá estava eu lendo esta história e falando sobre como podemos contribuir para cuidar do nosso planeta. Foi demais. As crianças adoraram, trocamos ideias e agora meus filhos querem que eu leia o livrinho em casa.
Tudo que a gente bota no mundo tem o poder de tocar ao menos uma pessoa e isso já faz valer a pena. E quanto ao meu ranço: melhor feito, que perfeito.
Mini curadoria semanal
Adorei escutar a Florence Williams no podcast do The 1000 Hours Outside. A Florence é autora do Nature Fix, um livro maravilhoso e gostoso de ler que explodiu a minha cabeça.
Adorei ler este artigo na Revista da Babbel sobre dialetos brasileiros. Na verdade o que mais gostei de aprender aqui foi sobre os tipos de variações linguísticas, sendo dialetos apenas parte de um tipo de variação.
Saiu a minha coluna deste mês no Euro Dicas onde falo sobre as mudanças que vivi em relação aos cuidados de beleza desde que saí do Brasil.
Que legal essa história Roberta! Me lembro muito bem do lançamento desse livro!! Livros não morrem jamais, tem sempre alguém tocado por eles. 😘