Meu pai repetia várias frases e palavras aleatoriamente e ria a beça. Era uma coisa de louco. Algumas só andavam juntas, por exemplo “passarinho que acompanha morcego, acorda de cabeça para baixo” andava sempre junto com “olho vivo que cavalo não desce escada". E ria e aí você ria junto porque era uma coisa muito louca e também porque o riso dele era muito infantil e feliz.
Algumas dessas frases se fixaram desde a sua infância. A clássica da categoria era “quer pra mim fazer uma pipa pra você?". Ele costumava repetir essa no corredor do prédio da minha avó na Praia de Botafogo, onde ele cresceu. Não sei a história de muitas das frases, mas dessa eu sei. Um menino do prédio, quando ele era criança, ofereceu para fazer uma pipa e falou desse jeito meio errado. Não tem a menor graça, mas deve ter sido muito engraçado no dia porque ele nunca mais parou de repetir.
Uma outra clássica que era compridíssima era “Maria Luiza que era muito da viva, foi ao baile do bisturi em Campos. Chegando lá, teve flertes com acadêmicos de medicina” que é um comentário-fofoca que alguém fez há 300 anos em Macaé e que ele amava. Ele amava tudo que os idosos da família falavam. Quase botei o nome da minha filha de Maria Luiza.
Quando fiz a placa para seu túmulo, mandei gravar “Data Venia!" que era uma coisa aleatória que ele repetia também. Muitas vezes vinha acompanhada de “Achtung!", mas não necessariamente. Teve vezes também que ele repetia coisas que eu contava para ele e que ele achou engraçadíssima. Aí depois ficava “hein Roberta, hein, hein!”. E ria de chorar.
Bom, percebi que estou incorporando esse tipo de demência. Há uns dois anos fomos a Lourdes, na França, e pegamos uma funicular para subir o Pic du Jer. A gravação dentro da funicular falava “Pic du Jer” de um jeito tão engraçadinho, com um sovaquinho tão fortezinho que eu e meu marido volta e meia quando escutamos alguém falando francês temos uma necessidade incontrolável de dizer “Pic du Jer!”.
Hoje tivemos outra. Três e meia da manhã e uma dessas pessoas com o arrombadíssimo trabalho de garantir que passageiros de low cost tenham uma mala de mão microscópica estava num surto de power trip alucinado e berrava para todos colocarem a malinha na mini caixa medidora. Quando não cabia, ela gritava NON e avisava a pessoa no balcão de check-in IL NON! e quando cabia ela gritava YES e dava um joinha.
Seus parâmetros eram extremamente rígidos. Se a alça da mala saísse um pouco para fora era NON. Brasileiras do meu lado já planejavam aplaudir para cada YES. Foi quando uma pessoa pôs apenas uma maleta micra, mas um pouco inchada de modo que fez uma barriguinha, um pequeno relevo, eu diria, para fora dos confins do medidor. Por esta terrível falta recebeu não um NON nem um YES, mas um IMPOSSIBLE.
Já repeti “impossible" e me escangalhei de rir umas 289 vezes.
Mini curadoria semanal
Amando Sobre os Ossos dos Mortos de Olga Tokarczuk. Me conta se você já leu e amou?
Levei na viagem para ler para as crianças Jabuti Sabido e Macaco Metido da Ana Maria Machado. Os dois piraram e querem ouvir essa história sem parar. Acharam o jabuti um gênio. É maneiro mesmo.
Vejo pouca coisa no Instagram hoje em dia, mas o perfil Tupinizando sempre mexe comigo. É um jeito de conhecer mais esse pedacinho de nós que nos foi negado na escola.
😂😂😂😂Vendo a cara do seu pai e do seu tio às gargalhadas e repetindo Achtung! sem parar. Aqueles gêmeos eram impossíveis, estar com eles era implicância e risada o tempo todo! Bons tempos!! Tempos de riso fácil e vida leve!😘
amei tanto tanto essa! me fez rir o tempo todo!