{Estrangeira #9} Catequizando a Alemanha Oriental
Como um ateu e uma agnóstica criaram um missionário em Fátima.
“Você conhece a história de Jesus?”
Era isso que meu filho de cinco anos perguntava aleatoriamente para as pessoas com as quais cruzava em Berlim, uma cidade dentro da antiga Alemanha Oriental onde quase ninguém conhece a história de Jesus ou quer conhecer.
Não sou cristã, longe disso, mas sempre me interessei pela história do desenvolvimento da fé como parte da história da humanidade. Também fiz catequese e primeira comunhão no Brasil. Todo mundo fazia.
Lembro bem como a professora Maria me detestava. Tínhamos um livro de colorir sobre cristianismo e eu questionava tudo que para ela era inquestionável. Lembro de me arrepender de ter pedido para fazer catequese com minhas amigas, mas terminei. Me vesti de branco como a pequena virgem que era, carreguei uma vela pelo longo corredor da igreja e fui me confessar. Lembro também de não saber o que confessar e o padre daquela igreja de vidro na Lagoa, no Rio, (qual o nome mesmo?) me deu dicas.
"Será que você não andou mentindo para a sua mãe?"
"Você tem feito o dever de casa?"
Aceitei suas sugestões e saí com mais dever de casa em forma de rezas. Pera, isso foi no dia da primeira comunhão ou foi uns dias antes?
O negócio é que F. me pediu para contar TUDO que sei sobre Jesus. Essa obsessão começou quando estávamos em Portugal escolhendo casa. Tiramos um dia e fomos à Fátima durante as festividades. Milhares de peregrinos chegavam, se ajoelhavam e assistiam à missa. Assistimos um pedacinho também. Expliquei para ele o mito do filho, pai e espírito santo e ele ficou muito impressionado. Contei também sobre o local onde estávamos, sobre as três crianças que viram seis aparições em 1917.
Fomos ao museu do santuário e vimos uma escultura enorme do Sagrado Coração de Jesus e ele também pirou nisso, mas essa eu não sabia explicar. O que se sucedeu foram semanas de perguntas sobre Jesus, áudios trocados com uma amiga mais religiosa e catequização de ateus berlinenses.
F. saía na rua não somente perguntando para as pessoas se conheciam a história de Jesus, mas também compartilhando todo seu conhecimento. Eu ria muito da coisa toda, as pessoas nos encaravam como se estivéssemos doutrinando nosso filho a catequizar a Alemanha Oriental. Uma mãe agnóstica e um pai ateu criaram um filho missionário que catequizava em alemão, mas falava "Jesus" em carioquês.
Quando nos mudamos para Portugal, F. sugeriu que colocássemos uma cruz gigante para decorar a parede da sala. Adotamos um cachorro e ele queria que se chamasse Cruz de Jesus (eu queria que se chamasse Fofoca, meu marido queria Escobar, todos concordamos com Pizza). Em algum momento expliquei para Franz que tudo era uma história e que algumas pessoas acreditam nela ao pé da letra, outras tiram lições.
"Mamãe, você acredita?"
"Eu não, filho. E você?"
"Eu acredito"
Hahaha, minha filha teve essa fase. Gabaritava as provas de religião na escola. Depois que virou adolescente só não perdeu a fé em tirar nota boa sem ter estudado nada. E eu até hoje brinco com ela que ela é minha santinha milagrosa.
A ver se ele vai se interessar por conhecer e seguir o catolicismo. A fé é algo intrínseco mesmo, inexplicável. Meu pai era um homem de fé católica As vezes eu o invejava por isso porque a fé que ele tinha apaziguava seu coração e mente em momentos de sofrimento e decepção.